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Quinta-feira, 28 de março de 2024

Geral

26/12/2011 10:46:56

Justiça absolve ex-secretário de Terras de Vilhena da acusação de cobrar propina

O advogado Bruno Pietrobon e se assessor, Ademir Alves de Lima, foram absolvidos por unanimidade pelo Tribunal de Justiça de Rondônia da acusação de corrupção passiva. Os dois eram acusados por um produtor rural de cobrar propina de R$ 50 mil para transformar em imóvel urbano uma chácara nos arredores da cidade.

O autor da denúncia contra Pietrobon, em 2009, época em que ele era secretário de Terras, é Sérgio Fernandes Rodrigues, que chegou a usar no corpo equipamentos de escuta, instalados pela Polícia Federal. Bruno e Ademir foram presos com base no áudio da conversa que tiveram com o delator dentro da Secretaria de Terras. Dias depois, foram liberados para responder ao processo em liberdade.

Ao julgar o suposto crime em Vilhena, o juiz Luiz Antônio Peixoto considerou o procedimento de escuta ilegal, mas concluiu que o depoimento da vítima era suficiente para a caracterização da cobrança de propina.

No TJ, o relato da matéria foi o desembargador Walter Waltenberg Silva Júnior, que entendeu que o Ministério Público, autor da ação contra Bruno e Ademir não recorreu questionando a ilegalidade a ilegalidade das gravações.

VEJA ABAIXO A ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO QUE ABOLSVEU OS DOIS:

 

DESEMBARGADOR WALTER WALTENBERG SILVA JUNIOR
RELATOR


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça
2ª Câmara Especial

Data de distribuição :28/07/2011
Data de julgamento :11/10/2011

0083914-19.2009.8.22.0014 Apelação
Origem : 00839141920098220014 Vilhena/RO (1ª Vara Criminal)
Apelante : Bruno Leonardo Brandi Pietrobon,
Advogados : Carla Falcão Rodrigues (OAB/RO 616-A) e
Carlos Eduardo Chaves Pietrobon (OAB/RO 2.328)
Apelante : Ademir Alves de Lima
Advogados : Roberley Rocha Finotti (OAB/RO 690) e
Josafá Lopes Bezerra (OAB/RO 3.165)
Apelado : Ministério Público do Estado de Rondônia
Relator : Desembargador Walter Waltenberg Silva Junior
Revisor : Juiz Jorge Luiz dos S. Leal



RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas por Bruno Leonardo Brandi Pietrobon e Ademir Alves de Lima, inconformados com a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Vilhena, na qual restaram condenados pela prática do delito previsto no artigo 317 (corrupção passiva), c/c o 327, § 2º (funcionários públicos), ambos do CP, às penas de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, que foram substituídas por duas restritivas de direitos, consistente na prestação pecuniária no valor de cinco salários mínimos para cada denunciado, destinados à AEMOM e à A.P.A.E, respectivamente, além da prestação de serviço à comunidade com local a ser especificado pela Vara de Execuções Penais.

Consta dos autos que o Ministério Público ofereceu denúncia contra os apelantes pelo fato de que, no mês de agosto de 2009, especialmente nos dias 19 e 20, nas dependências da Secretaria Municipal de Terras-SEMTER, na cidade de Vilhena, agindo em conluio e com identidade de propósitos, no exercício de cargos em comissão e função pública de direção, solicitaram em proveito próprio vantagem indevida, consistente no valor de R$50.000,00, em prejuízo de Sérgio Fernandes Rodrigues, como condição para que pudessem agilizar o trâmite de um requerimento formalizado que tinha por objetivo a transformação de uma área rural em urbana.



O juízo a quo afirmou que a materialidade do delito está comprovada pela documentação e pelos depoimentos juntados aos autos, bem como a autoria, salientando que o crime de corrupção passiva se dá às escondidas, longe da presença de outras pessoas, de modo que a palavra da vítima possui relevada importância, de modo que, no presente caso, embora a gravação dos diálogos tenha sido taxada como ilegal ante a ausência de autorização judicial, tal ilicitude não contaminou o depoimento da vítima, o qual foi colhido sob o crivo do contraditório e está em perfeita consonância com a fase do inquérito.

Nas razões de apelação, os apelantes pugnam pela absolvição com o fundamento de não haver prova suficiente para a condenação. Argumentam que para a configuração do crime de corrupção é necessário a competência do agente para a prática do ato, o que não ocorre no presente caso, uma vez que os apelantes, ainda que ocupantes à época dos cargos de Secretário de Terras e assessor, respectivamente, não possuíam poderes para a prática do ato questionado, uma vez que a aprovação de transformação de área rural em perímetro urbano é da competência do setor de engenharia, urbanismo, planejamento e procuradoria jurídica, com aprovação final do Poder Legislativo, além de que o pedido do apelado era impossível, por não ser permitido a construção de granja em área de perímetro urbano.

Aduzem que a condenação foi firmada exclusivamente no depoimento da vítima, enquanto os demais testemunhos compromissados relatam não ter existido qualquer solicitação para a prática do ato narrado.

Requerem, ao final, a reforma da sentença para que os apelantes sejam absolvidos das condenações impostas.

Em contrarrazões, o Ministério Público de primeiro grau manifestou-se pela manutenção integral da sentença, uma vez que as provas são consistentes, pois as declarações da vítima estão em consonância com as demais provas existentes nos autos.

O Procurador de Justiça Ivo Benitez, em parecer de fls. 407/412, opina pelo não provimento do recurso, sob o argumento de que a autoria do crime de corrupção passiva perpetrada pelos apelantes restou incontroversa, conforme apontou o conjunto probatório.

Em síntese, é o relatório.

VOTO

DESEMBARGADOR WALTER WALTENBERG SILVA JUNIOR

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

O Ministério Público ofereceu denúncia em face dos acusados Bruno Leonardo Brandi Pietrobon e Ademir Alves de Lima pela prática do delito denominado corrupção passiva, na forma do art. 317, caput, c/c o 327, § 2º, ambos do CP.

A sentença julgou procedente a pretensão punitiva, condenando os apelantes à pena de 2 anos e 8 meses de reclusão e 13 dias-multa, que foi substituída por duas restritivas de direitos.

Inconformados com a condenação, os apelantes recorrem para serem absolvidos, sob a alegação de insuficiência de provas e crime impossível.

Pesa contra os apelantes a condenação pelo crime de corrupção passiva em virtude de terem exigido da vítima Sérgio Fernandes Rodrigues a quantia de R$50.000,00 para que pudessem agilizar o trâmite de um requerimento formalizado na Secretaria de Terras de Vilhena, em que Bruno Leonardo Brandi Pietrobon figurava como Secretário e Ademir Alves de Lima seu assessor.

Dessa forma, passo à análise das provas em relação aos fatos.

Consta dos autos que a vítima Sérgio Fernandes Rodrigues, na data de 18 de agosto de 2009, foi até a Delegacia da Polícia Federal de Vilhena, oportunidade em que relatou que possuía um requerimento na Prefeitura cujo pedido consistia na descaracterização de perímetro rural para urbano, o qual havia sido encaminhado para votação na Câmara Municipal, contudo, em virtude da constatação de inclusão indevida de outra área no projeto de lei, o processo foi retirado para correção. Dirigiu-se então até a Prefeitura à procura do Secretário Bruno Pietrobom para saber porque ainda não havia sido enviado o projeto de lei com as devidas correções à Procuradoria, quando foi atendido pelo Ademir, assessor de Bruno, que falou da necessidade de fazerem um ¿acordo¿ para o andamento do processo, de modo que Ademir pediu que voltasse à Prefeitura no dia seguinte para combinarem o valor e quando retornou conversou com Ademir e Bruno, momento em que lhe foi solicitado a quantia de R$50.000,00 para dar andamento ao projeto, que, após isso, procurou a delegacia para fazer a denúncia.

Consta ainda que a vítima teve mais um encontro com os apelantes, munido de equipamento de gravação de som e imagem, oportunidade em que ficou registrada toda a negociação, conforme depoimento prestado na Polícia Federal e, portanto, a comprovação da exigência do dinheiro.

Contudo, por meio da decisão de fls. 220/221, o juiz reconheceu a ilicitude da gravação sob o argumento de que não foi previamente autorizada pela autoridade judiciária, o que viola o preceituado nos arts. 1° e 2° da Lei n. 9.034/95, conforme entendimento do STF (Inq 2424/RJ, DJ 16.11.2008). Por conseguinte, determinou-se o desentranhamento da gravação ambiental.

É certo que não houve a interposição de recurso desta decisão e nem mesmo da sentença por parte do Ministério Público, portanto, a matéria referente ao reconhecimento da ilicitude da gravação tornou-se preclusa, o que ensejou sua inutilização total para fins de prova.

Peço vênia para abrir um parêntese sobre esse fato e apenas deixar registrado que a jurisprudência tem reconhecido a validade da gravação ambiental quando realizada por um dos interlocutores, principalmente quando este for vítima, o que assegura a força probatória para a persecução criminal. Precedentes: STF RE 402717, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO, Segunda Turma, julgado em 02/12/2008; STF AgRg no Ag 1142348/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 20/10/2009.

Ocorre que a inércia do Ministério Público, na função de autor da ação penal fez precluir qualquer questionamento a respeito da decisão proferida pelo juízo singular no que diz respeito ao reconhecimento da ilicitude da prova e, por consequência, o seu desentranhamento dos autos.

Com isso, o único elemento probatório que restou nos autos foi a palavra da vítima, pois as demais testemunhas ouvidas afastaram qualquer indício de conduta que pudesse configurar o tipo penal previsto para o crime de corrupção passiva, senão vejamos.

A vítima Sérgio Fernandes Rodrigues, ouvida em juízo à fl. 280, reiterou as declarações prestadas perante a autoridade policial. Em síntese, afirmou que Ademir e Bruno lhe disse que a liberação de seu projeto teria um custo de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), segundo orientação do chefe de gabinete Gustavo e, após isso, iniciaram-se as negociações e o pagamento seria R$20.000,00 como condição para o projeto seguir até a Procuradoria do Município e o restante para tramitar até a Câmara Municipal. Acrescentou que quando ocorreram as prisões, na pasta do declarante perante a Prefeitura só existia um pedido de arquivamento do seu projeto e desapareceram os demais documentos e a partir deste evento passou a ter dificuldades para conseguir a liberação junto a prefeitura.

As testemunhas Carlos Eduardo Machado Pereira, Edení Simões de Oliveira, Mauro Bianchin, todos funcionários públicos e responsáveis direta ou indiretamente pela tramitação administrativa dos projetos, ouvidos às fls. 282/284, foram uníssonos em afirmar os denunciados em momento algum pediram qualquer tipo de vantagem, seja para agilizar ou aprovar o projeto da vítima Sérgio.

Não obstante, a testemunha Arlete Alves Toledo, servidora pública estadual, ouvida à fl. 285, relatou que trabalhava no hospital regional e em determinada ocasião atendeu o irmão da vítima Sérgio, e este quis contratar os serviços da declarante no hospital para que a mesma atendesse seu irmão naquele setor e afirmou que pagaria o que ela pedisse, pois disse que ¿todos tinham um preço¿. Disse, ainda, que neste dia, o pai de Sérgio narrou que um delegado da polícia federal havia dado certa quantia em dinheiro para seu filho e instalado em suas vestes uma câmera e um microfone para pegar o Dr. Pietrobon, Gustavo e o Prefeito, mas acabou pegando outras pessoas, referindo-se a dois meninos e falou que se tratava de um condomínio e a outra parte do terreno seria uma granja.

Os apelantes também negaram a prática do delito de corrupção passiva.

É certo que nos crimes praticados às escondidas, a palavra da vítima se reveste de força probatória e quando uniforme com as demais provas dos autos pode ensejar o decreto condenatório.

E nesse sentido, segue a juriprudência dos Tribunais Superiores:

HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. AUSÊNCIA DE OITIVA DA VÍTIMA EM JUÍZO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INEXISTÊNCIA. CONDENAÇÃO FUNDADA EM TODO ACERVO PROBATÓRIO E NÃO APENAS NO DEPOIMENTO DA VÍTIMA. ORDEM DENEGADA. 1. A sentença condenatória transcrita acima encontra-se em consonância com a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, que se consolidou no sentido de que, ¿nos crimes sexuais, a palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos de certeza dos autos, reveste-se de valor probante e autoriza a conclusão quanto à autoria e às circunstâncias do crime¿. Precedentes. 2. Os elementos do inquérito podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em juízo. 3. Para se acolher a tese da impetração e divergir do entendimento assentado no julgado, seria necessário apurado reexame de fatos e provas, o que é inviável na via estreita do habeas corpus. Precedentes. 4. A ação de habeas corpus não pode ser utilizada como sucedâneo de revisão criminal. Precedentes. 5. Writ denegado. (HC 102473, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 12/04/2011, DJe-080 DIVULG 29-04-2011 PUBLIC 02-05-2011 EMENT VOL-02512-01 PP-00032).

HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA E PELO CONCURSO DE PESSOAS, EXTORSÃO COM EMPREGO DE ARMA, EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO E ESTUPRO. CONDENAÇÃO COM TRÂNSITO EM JULGADO. REVISÃO CRIMINAL INDEFERIDA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO APROFUNDADO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADA POR ELEMENTOS IDÔNEOS. ORDEM DENEGADA.
[...].
3. Nos crimes contra os costumes a palavra da vítima se torna preponderante, se coerente e em consonância com as demais provas coligidas nos autos, como é o caso da hipótese vertente, em que a ofendida expôs os fatos com riqueza de detalhes, tudo em conformidade com os demais elementos probantes.
4. [...]
5. Ordem denegada.
(HC 150.812/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 01/8/2011).

No caso, entendo que a palavra da vítima isolada não é suficiente para que ensejar a condenação dos apelantes, até mesmo porque sua credibilidade restou enfraquecida diante do depoimento da testemunha Arlete Alves Toledo.

Esclareço que, não desconheço que pelos fatos que se tomou conhecimento pela gravação ambiental é possível constatar extrajudicialmente a ocorrência do crime, mas o sistema processual atual não permite que tais fatos possam ser levados em consideração para este processo, uma vez que foram oriundos de prova considerada ilícita por meio de decisão, da qual não houve recurso pelo Ministério Público.

Logo, admitir qualquer que seja o valor atribuído a estes fatos é ofender manifestamente o devido processo legal.

Assim, atento a todo contexto contido dos autos, entendo inexistir provas suficientes no sentido de que os apelantes tenham solicitado vantagem ilícita da vítima em razão dos cargos que ocupavam.

Pelo exposto, dou provimento aos recursos de apelações para absolver os denunciados Bruno Leonardo Brandi Pietrobon e Ademir Alves de Lima das penas do art. 317 (corrupção passiva) c/c o 327, § 2º (funcionários públicos), do CP, com fundamento no art. 386, VII, do CPP.

É como voto.





Fonte: TJ/RO
Autor: Da redação

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